Buzina.


Desceu a escada correndo, sorriu para o cliente:

- Aqui, obrigada, boa tarde.

Virou, prestou atenção em si mesmo subindo as escadas, correndo, pulsando, o coração. Não entendia mas estava no automático. 


Desaprendeu a gostar de coisas boas, primeiro as muito boas como beber e fumar. Depois comer e cagar, e por fim se contentava estar de frente a tv com um doce. 


- Bukowski teria vergonha de mim mas certamente as redatoras de NY se orgulhariam agora. A mulher perfeita. Não tão vaidosa, não tão atenciosa. Detalhista. Leal. Trabalha até à exaustão e é tão responsável a ponto de trocar um rolê pra pagar contas. God! Quem ainda faz isso após uma pandemia?

Um dia, sua mãe perguntou: 

- Precisa de algo?

- Sim, de uma lava louças enorme e um liquidificador novos.


Não pedira carinho, passeio ou mimo. Pedira eletrodomésticos. Ela só tinha 27. 


Depois do vício em cocaína se tornou difícil gostar de coisas superficiais, passava a dar valor cada vez a coisas mais simples e básicas, a essa altura, corrompera seu Ateísmo. Tornara-se agnóstica. Cultuava Deus cristão mas ao mesmo tempo flertava com o daime. 


- Qualquer dia consagro e vejo no que dá, se tô no caminho errado isso me avisa.


O dia nunca chegava. Sempre haviam novas urgências.


Um dia não acordou mais. Morrera aos 28, sem máquina de lavar louças, sem fumar um último cigarro e sem viver, plenamente, alguns de seus grandes amores. 


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